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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Ex-jornalista conta como funciona os interesses políticos e particulares nas emissoras de TVs

Essa semana, no Dia do Repórter, um dos nossos leitores que já atuou como jornalista em algumas emissoras de TVs regionais, postou em seu perfil pessoal no Facebook o que ele presenciou durante sua trajetória profissional.

A postagem pode ser encontrada em seu perfil clicando aqui.

O texto que você lerá é bem longo. Porém, é muito bem escrito e lhe convidará a ler até o final.

A autoria é do ex-jornalista Lucas Salgado.



"   Hoje comemoraria mais uma passagem do dia do repórter, mas não o farei. Abandonei a área que tanto amo por princípios éticos. Fui me desgastando.


   Talvez com esse texto as pessoas entendam o real motivo do meu abandono até então enigmático do jornalismo.





   O jornalismo é responsável pela formação cultural, intelectual e promove a discussão entre a massa (pessoas atingidas em escala pelos veículos de imprensa). Dada importância, as emissoras deveriam ser fiscalizadas pela própria comunidade.


   O desserviço ofertado pela mídia atribui conhecimentos comprados e capitalistas à maneira de pensar das pessoas. Várias teorias fundamentam o poder de persuasão dos veículos, uma delas a do agenciamento. Segundo o pensamento, as notícias veiculadas pautam a conversa das pessoas, modificam o seu dia a dia. A mídia expõe aquilo que julga importante, o público acredita sem pestanejar e ainda repassa sem questionar. Aí mora o perigo e eu explico adiante.


   O jornalismo que vemos, ouvimos e lemos é o mesmo que os políticos, os órgãos públicos e as empresas privadas querem que aceitemos como verdade absoluta. Tudo que é noticiado, infelizmente, envolve dinheiro – ou vai envolver.


   Quando dizem que os jornalistas são figurantes contratados para tornarem público o que querem que se torne público é verdade. As prefeituras, o estado e o governo federal, por exemplo, colocam dinheiro nos veículos de imprensa através da compra de publicidade. A forma como o dinheiro é distribuído em cada empresa é moralmente ilegal.


   O investimento depende basicamente do nível das matérias levadas ao consumidor de informação. Funciona mais ou menos assim: quando damos espaço para a comunidade reclamar dos serviços públicos, os órgãos teoricamente anunciam mais nas emissoras. E quando isso acontece, as reportagens se acalmam e a comunidade volta a ser passiva no recebimento de informações escondidas ou levemente apagadas.


O pauteiro do jornalista é o comercial


   Durante estadia nas duas emissoras de televisão, assistia de camarote outras cenas desconexas do jornalismo, mas dessa vez com empresas privadas. Elas, através de assessorias de imprensa, obrigavam-nos a produzir matérias irrelevantes: um mercado que apresenta novo uniforme de trabalho, por exemplo. Se não fosse exibida a reportagem, a rede varejista deixaria de anunciar na televisão. E lá vai o cinegrafista com o repórter cobrir o evento que mais tarde é repassada à massa que aceita como informação – e é, mas ocupa espaço para outras mais importantes e que não são noticiadas por não haver investimento para tal.


   Veja esta segunda situação e avalie: seria muito estranho um canal de televisão não informar aos telespectadores sobre a realização de um festival, certo? Pois acontece com vários eventos particulares. Na televisão a qual trabalhei não divulgariam um festival italiano – a menos que a organização colocasse dinheiro na emissora. Após a empresa de eventos deixar um cheque, a história mudou – o que fez com que a comunidade soubesse, por fim, da realização do programado.


   Resumindo: os veículos de imprensa trabalham na base das verdinhas brasileiras – ou estrangeiras, dependendo do acordo que pode acontecer. Não pagou, não informou.


Ética profissional

   E pode soar estranho mesmo falar de ética num ambiente conturbado por negociações políticas, partidárias, sociais e financeiras, não é? O jornalismo, assim como qualquer outra profissão, tem a ética como vertente.


   Aprendi que não devemos inventar fontes e nem escolher entrevistados com intenções financeiras. Não precisou mais que dois meses pra ver que isso não existe. A maior parte dos veículos de imprensa – pra não dizer toda - é antiética. Inventar fontes e fazer matéria de algo irrelevante para agradar uma empresa privada parece regra do jornalismo. Todos os veículos já foram comprados (ou tentaram comprar) – faz parte do negócio. E para os jornalistas que querem mudar a forma como se faz comunicação, restam duas escolhas: seguir a linha editorial ou aceitar a demissão.


A inverdade absoluta

   Mas até me desiludir com a profissão acompanhava diariamente as notícias em canais de televisão, rádio, jornais impressos, revistas e em plataforma virtual. Hoje mudei meus hábitos: não assisto mais televisão como fonte de informação, não acredito mais nas coisas que leio em sites e jornais bastante visitados e lidos e pesquiso tudo em veículos livres com jornalistas livres.


   Hoje abandonei a carreira em nome dos meus princípios, da liberdade e por ser apaixonado por jornalismo. Jornalismo que informa e não é comprado. Eu não sou comprado e não comprarei a massa que tem como verdade aquilo que a mídia golpista transmite. "


Lucas Salgado, Blumenau - Santa Catarina


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O dia escolhido por Lucas foi proposital para trazer ao público situações presenciadas pelo mesmo.


Talvez situações que lhe atormentam todos os dias por um sonho profissional que veio a ruínas por conta de quem atua na profissão.


Eu, particularmente, também não vejo TV e também não acho que estar sempre conectado à ela mudará minha vida. Talvez mudaria, mas para pior.


Nenhum dos meus investimentos pessoais incluem TV por assinatura ou até mesmo, uma sala confortável para ver a novela. Almejo ir além do que me repassam e pedem pra eu repassar.


Parece absurdo, mas sempre afirmo quando me indagam o por quê:


Se pessoas milionárias assistissem os noticiários e os episódios das novelas todos os dias, o que você mais veria nos comerciais seriam Lamborghinis e Ferraris sendo anunciadas.

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